O excesso de trabalho continua a prejudicar o trabalho de vários autores de mangás

Com a morte do autor Kentaro Miura confirmada no início do mês de maio, uma velha discussão sobre a saúde e a qualidade do trabalho dos autores impacta na continuidade de suas obras.

08/06/2021 Última edição em 08/06/2021 às 19:27:09

Infelizmente, no dia 20 de maio, os amantes de mangás foram pegos com uma notícia que ninguém gostaria de receber. Kentaro Miura, autor de Berserk, faleceu aos 54 anos devido a uma dissecção aguda na aorta. Na realidade, Miura faleceu no dia 6 de maio, porém, foram divulgadas as circunstâncias de sua morte quase duas semanas depois.

Berserk é uma das maiores séries de mangás que temos atualmente e era publicada desde 1989, com cerca de 363 capítulos em 40 tankobons. A história narra as aventuras do mercenário Guts em meio a um universo medieval e seres fantásticos. A narrativa se aprofunda em questões como religiosidade, magia e o tom sombrio dita o ritmo da obra e de seus personagens. Logo após a morte do autor, foi divulgado que Berserk atingiu a expressiva marca de 50 milhões de cópias em circulação pelo mundo, tornando-se uma das séries de mangás mais vendidas de todos os tempos.

Assim que a morte de Miura foi anunciada, dois grupos se posicionaram de lados opostos e passaram a discutir os caminhos que eventualmente a obra vai tomar – já que o último volume publicado ainda demonstrava que a trama se encaminhava para o fim, e o outro grupo, que ressaltava as condições de saúde do mangaká. É evidente que os autores sofrem pressão dos editores por lançarem os capítulos semanalmente e o excesso de trabalho é uma marca que muitos deles reclamam, inclusive dentro de suas próprias publicações.

A obra teve vários intervalos de publicação, onde o autor deixava claro a exaustão que era levar os capítulos publicados adiante, mesmo contando com uma equipe ao seu lado. Os leitores reclamavam da lentidão dos capítulos e outros apontavam que, em algumas ocasiões, Miura passava o tempo livre jogando vídeo game do que de fato desenhando. Miura não trabalhava sozinho. Muito pelo contrário, ele possuía uma equipe de assistentes que o auxiliavam no decorrer da história. A equipe era composta por Hideki Sugimoto, Yoshimitsu Kurosaki, Akio Miyaji, Shinshu Hirai e Arihide Nagashima. No twitter, foi divulgado que a obra continuaria com a seguinte postagem : “Faremos nosso melhor”.  É bem provável que o autor tenha compartilhado o seu desejo quanto ao final da trama e na qualidade dos assistentes, cabe finalizar o desejo de Miura.

Excesso de Trabalho X Qualidade

Autores de mangás, sempre se depararam ao longo dos anos com o mesmo dilema: a qualidade de vida atrelada ao excesso contínuo de trabalho. Muitos são acometidos por problemas decorrentes de anos desenhando e a pressão que sofrem de seus editores é algo surreal.

Mangakás mais contemporâneos tem uma preocupação de não trocar a vida pelo trabalho e como exemplo disso, é válido dizer que Eichiro Oda, autor de One Piece, negociou uma semana de folga por mês com a Shonen Jump. Oda trabalha em um ritmo absurdo e o seu mangá já passou dos 1000 capítulos recentemente. Yoshihiro Togashi, autor de Yu Yu Hakusho e Hunter x Hunter, também já teve vários problemas de saúde e, hoje em dia, tem liberdade para conduzir a publicação na frequência que quiser. Outro autor famoso Takehiko Inoue (Vagabond), paralisou a história desde 2015 para se cuidar melhor. O ritmo frenético que esses autores levam, aliado a uma rotina  desgastante, onde muitos se alimentam mal e não conseguem dormir o tanto que deveriam, culmina em prejudicar a saúde deles.

Nos últimos tempos, Miura demonstrava que de fato havia mudado esse jeito de encarar as coisas e em uma matéria da revista Young Animal de 2019 – onde Berserk era serializado - mostrava o estúdio Gaga, local que Miura trabalhava com os seus assistentes e eles relataram posteriormente, que o chefe se alimentava bem e mantinha uma rotina de exercícios. O autor não possuía nenhuma doença crônica, mas a discussão sobre o que acarretou o óbito, pode levantar diversos indícios. O que é cabível discutir seria sobre a rotina dos autores e o modo de trabalho deles. Algumas editoras, como a Jump, passaram a se moldar ao ritmo do autor e essa flexibilização ajuda a manter a obra em curso e o mais importante, mantém a saúde física e mental em ordem.


Especulações vão surgir aos montes, ainda mais na época da internet. Os leitores sempre vão criticar os autores pelo atraso e esquecer do lado humano e social deles. Não deviam fazer isso, pois todos estamos propícios a passar por esse tipo de coisas em nossas vidas. Quem nunca se sentiu pressionado em um trabalho ou teve que se virar para entregar algum projeto no prazo? Se o autor tirou algumas horas para descansar e jogar um game, que mal tem nisso? Não é falta de responsabilidade nenhuma. O fato é que o autor morreu e devia-se pensar primeiro nas condolências à sua família e agradecer profundamente pela contribuição que Miura nos deixou por criar Berserk.




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