Death Note: a vitória não explícita de L
Como L impôs sua marca em "Death Note", e como as suas atitudes, ações e a sua posição de total desvantagem o colocaram como o verdadeiro vencedor na batalha com o Kira. Vamos mergulhar na mente de um dos maiores gênios dos Shounen.
ATENÇÃO! CONTÉM SPOILLER!
Há algum tempo atrás, dois redatores da Blast elaboraram um texto dissertativo sobre a bipolaridade gerada entre os fãs do anime “Death Note”. Na ocasião, estes redatores, em conjunto, colocaram pontos em discussão, evidenciando uma suposta superioridade do Kira, tanto intelectual, quanto moralmente falando. Não me lembro ao certo se essa matéria chegou a ser publicada, porém, mesmo assim, gostaria de me desculpar com o próprio “L” que, apesar de não passar de um personagem de ficção, merecia mais respeito de minha parte, com um contraponto contundente a todas as opiniões dos redatores em questão, em relação ao tema, nem que fosse para ficar apenas nos arquivos internos da rádio, sem exposição pública. Enfim, a resposta veio, tardia, porém não-falha.
Quero deixar claro também, desde o início, todo o meu apreço e toda a minha admiração pelo personagem L. Não faço questão de mostrar-me imparcial em nenhum momento, e apesar de (possivelmente com algum empenho) eu conseguir reconhecer êxitos e méritos no personagem principal da série, devo reconhecer que, para mim, fica difícil, senão impossível, reconhecer qualquer valor positivo nele, quando o assunto é moral e ética. Vamos lá!
Kira foi um ditador sanguinário. Isso é fato. Ele manipulou indefesos, colocou seus próprios interesses à frente dos interesses coletivos, matou inocentes e colocou tantos outros em perigo iminente de morte, sempre se agarrando ao poder do caderno, e tendo nele (caderno) a materialização da sua covardia, afinal ele não era um deus, e não tinha nenhum poder ou talento natural para um combate físico.
Partidários de algum dos dois lados (Kira ou L) podem estar se perguntado por que eu não comentei sobre o fato do Kira ter matado bandidos também, seja para parabenizá-lo pela atitude “generosa” de se empenhar na “limpeza da sociedade”, ou para defender a ideia de que “bandido bom é bandido com seus direitos garantidos”. A você, garantista, que pode estar criando alguma expectativa de que eu vá defender bandidos, mesmo que indiretamente, eu devo lhe poupar de uma frustração. Eu gosto de bandido morto, sim.
Para mim, um bom bandido [que comete crimes hediondos], é um bandido julgado e sentenciado segundo a constituição vigente no local do crime, e se for o caso, morto. Para mim, isso é justiça. Eu sou a favor da pena de morte para alguns crimes, mas não sou a favor que ninguém assuma o posto de julgador monocrático e executor de pena de maneira arbitrária. Isso é diferente de ser compreensível num caso onde o agressor seja morto por um indivíduo em legítima defesa ou até mesmo em retaliação. E mais: ser compreensivo, não significa ser conivente em todos os casos. Pode parecer que eu estou fugindo ao foco do enredo do anime, mas não. Toda essa explicação é necessária.
Qual a diferença moral entre Kira e L na hora de julgar alguém? A resposta é simples: um deles, numa atitude republicana, conquistou sua posição de detetive e, de certa forma, de julgador. O outro, foi ungido pela sorte de encontrar uma arma covardemente poderosa, e, numa atitude infantil, pseudo-revolucionária e inconsequente, se auto atribuiu a responsabilidade de julgar as pessoas, se confundindo com um deus, que não é, sendo a prova maior disso, a sua morte, sofrida, humilhante, indigna.
Pode não parecer muito convincente tentar desconstruir a imagem “divina” imposta a Kira por ele próprio e por seus leais seguidores, apenas destacando aspectos mais pragmáticos, como o fato dele ter morrido [humilhantemente], sendo que deuses não morrem. Mas a verdade é que essa devoção a um personagem mortal, que perde o autocontrole constantemente, que necessita de um objeto estranho à sua natureza para “expressar poder”, que é obrigado a se rebaixar, fazendo um jogo de manipulação de pessoas para conseguir o que quer, só é possível para aqueles que têm uma enorme carga ideológica, sendo altamente contaminados por ideais utópicos e infundados de justiça. Quer exemplos desse tipo de pessoa? Os redatores citados no início dessa matéria servem. Vamos ver como essas pessoas pensam? Segue um trecho da matéria feita pelos referidos redatores da Rádio Blast, Intitulada "Kira vs L - O Deus do Novo Mundo":
Mesmo antes do caderno cair no mundo dos humanos, Light já tinha o objetivo de melhorar o mundo porque ele estava "podre" no sentido de estar ruim, péssimo, insuportável como hoje em dia (...) Ok, agora e se você junta esse desgosto com um tédio enorme de viver num mundo chato, onde é a mesma coisa todos os dias e que por mais que você queria criar forças para poder torná-lo mais interessante, você não consiga?
A verdade é que Light demonstrava bastante desconforto com ensinamentos religiosos que, em sua mentalidade, eram incompatíveis com os acontecimentos que o rodeavam. Em sua cabeça, o mundo estaria claramente desamparado de forças divinas, e a prova disso eram todos os crimes, todas as injustiças, todos os desastres ambientais provocados pelos homens, e foi assim que ele começou a se enxergar moralmente superior aos demais seres humanos.
Logo no primeiro episódio, Light dá uma demonstração do que ele viria a ser, caso fosse comprovado o seu poder de matar a distância, e caso esse poder viesse a ser duradouro. Isso aconteceu historicamente com todos os líderes autoritários.
Light presencia a seguinte conversa entre alunos durante o intervalo na escola:
-Yo, amigo!
-O que foi Sudô?
-Você não disse que me emprestaria dois mil ienes?
-O quê? De novo? Eu não posso fazer isso!
Light Yagami, presenciando a cena, pensa em matar o aluno. Segundo o seu código de conduta, a atitude de Sudô já era o suficiente para levá-lo a morte.
-Sudô... Acho que eu devia tentar matar esse cara.
Mas logo ele desiste. Não por qualquer resquício de maturidade, mas sim, por medo de ser descoberto.
-Não. É melhor tentar evitar matar pessoas que eu conheço.
A mentalidade que cria essa vontade de praticar uma justiça banalizada e esse receio de ser punido por isso, que demonstra bastante infantilidade e visão rasa de mundo, fica clara nesse trecho da matéria "Kira vs L - O Deus do Novo Mundo":
(...) quantas vezes você disse que o mundo precisava ser "restartado", "zerado” para começarmos de novo, por causa das violências e crimes que fazem ter desgosto da humanidade? Pelo menos uma vez você já pensou em algo parecido, e então por que não fez? A resposta em sua maioria será: porque não tem meios/poder/condição de fazer isso.
Apesar dos referidos redatores da Rádio Blast pensarem que atingiram uma unanimidade com essa pergunta, a verdade é que ela só gerou empatia em quem já possui a mesma mentalidade que eles, ou seja, aquela mentalidade com enorme carga ideológica, sendo altamente contaminados por ideais utópicos e infundados de justiça.
Na mesma cena, Light diz, ainda se referindo ao mesmo aluno, o Sudô:
- Alguém se importaria se um cara como ele desaparecesse algum dia?
Essa é a "bondade" do "deus do novo mundo".
Vamos pegar mais um trecho interessante da matéria "Kira vs L - O Deus do Novo Mundo":
Kira queria a justiça sendo aplicada na hora, sem dar tempo para o malfeitor fazer algo, por exemplo um refém, ou então matar e correr ou até mesmo fugir e sair impune. Kira queria na hora "não dar tempo ao crime". De fato, precisou se esforçar muito mais para que superasse a pessoa que estava impedido os seus objetivos. L era tão brilhante quanto ele mas o Kira tinha dois fatores que lhe fazia muito melhor: usar de aliados e sempre pensar três passos a frente do que seu inimigo.
Segundo os redatores, Kira queria a justiça sendo aplicada na hora. Ele tinha sempre plena convicção de que sua sentença era a mais justa possível, não precisando passar pelo crivo de estudiosos sobre filosofia, direito penal, antropologia, ou afins, e não sendo necessária a mínima participação popular para estabelecer os critérios para a punição, através de legisladores por exemplo. Sua decisão era sempre acertada, sempre com a pena de morte, e nunca tendo a mínima possibilidade de se cometer injustiças. Um simples noticiário na TV de um caso não julgado, e que ele sequer teve acesso ao acusado, às provas ou as testemunhas, já era o suficiente para a sua sentença. Certa vez, um defensor do Kira me disse que a "nossa democracia" não presta, porque ela permite que se cometam injustiças. Então, segundo ele, nós devemos entregar ou apoiar um poder absoluto nas mãos de uma única pessoa, e assim, conseguiremos uma justiça. Tirando toda a ficção de lado, é possível afirmar que Light nunca cometeu injustiças, em nenhuma das suas dezenas de centenas de condenações? Essas injustiças são explicáveis, caso seja por um “mundo melhor”, perfeito em algum aspecto, daqui a 200 anos? Se sua resposta foi “sim”, você tem a mesma "mentalidade revolucionária" de todos os maiores ditadores genocidas que já pisaram na Terra. São “os fins justificando os meios”.
É fato que Kira conseguiu diminuir a incidência de crimes que chegaram, segundo o anime, a quase zero. Ele conseguiu isso por meio do terror. Mas alguém pode dizer que Kira atingiu seu objetivo e esteve satisfeito em algum momento da sua vida? Não. Seres humanos não foram feitos com a capacidade de ficarem satisfeitos em algum momento da vida, e é por isso que não devemos apoiar ditadores. Kira continuou matando pessoas com crimes menores e, na verdade, mesmo antes de a população praticamente parar de cometer crimes hediondos, por medo da “Justiça de Kira”, ele já estava matando pessoas que cometessem crimes menores, como por exemplo, aqueles que não concordavam com a sua "mentalidade revolucionária".
É como oferecer um “bom paredão”, uma “boa espingarda”, uma “boa pá” e uma “boa cova” a todos aqueles que, apesar de serem "pessoas boas", não se permitem serem convertidas ou compradas, devido ao que o ideólogo do comunismo italiano, Antonio Gramsci, chamava de "simples intransigência”.
Eu, Nobunaga, num mundo defendido pelos referidos redatores da Rádio Blast, deveria ser morto por "simples intransigência", por simplesmente não concordar que inocentes fossem mortos para que, num futuro com data incerta, o mundo fosse perfeito em algum aspecto.
No anime, Kira e seus seguidores achavam aceitável que pessoas inocentes fossem mortas para que o mundo fosse melhor posteriormente. Mas será que eles dariam suas vidas para isso? Kira correu desesperadamente no final do último capítulo, fugindo da morte, mesmo tendo sido desmascarado e mesmo sabendo que estaria condenado pela justiça dos homens. Ele esteve desesperado buscando maneiras de se salvar, porém, achava plausível que outras pessoas morressem em nome de um mundo idealizado por ele. Algum fã do Kira já parou para pensar e fazer uma ligação entre essa cena e as mortes dos inocentes? Se o Kira tinha convicção de que ele estava na verdade se sacrificando pelo bem na humanidade, então porque ele não aceitou que outra pessoa colocasse em prática o seu projeto de mundo perfeito, e porque ele não aceitou a morte em nenhum momento, mesmo sabendo que seria condenado, caso conseguisse sobreviver? Egoísmo. Kira nunca amou a humanidade a ponto de querer transformá-la, ele idolatrava a si próprio e buscava satisfazer seu ego, somente. Sua ganância por poder se justificava pela maneira em que ele enxergava a si mesmo: um ser moralmente superior.
Bom, já irritei bastante os fãs do Kira mostrando toda a sua hipocrisia e falta de caráter. Agora tá na hora de irritar mostrando o quanto ele era inferior ao L em termos de inteligência. Vamos aos fatos!
Kira não tinha escrúpulos. Ele matava, manipulava e punia quem se opusesse a ele, esmagava sentimentos de pessoas que o rodeavam e não tinha nenhum problema em trair. Ele usava até mesmo sua beleza física para obter vantagens na hora criar marionetes. Tudo isso está claro no anime.
Kira tinha um caderno que matava a distância. Ele tinha simplesmente a maior arma de destruição da história da humanidade. Como eu já disse, o caderno lhe conferia um poder covardemente letal, ao mesmo tempo sorrateiro, silencioso. Esses fatos juntos, mostram o quão vantajoso era estar na pele do Kira, e o quão fácil era para ele conseguir o que desejava, mesmo sem nenhum talento muito especial além de inteligência.
E por falar em inteligência... Os referidos redatores da Blast disseram o seguinte na matéria "Kira vs L - O Deus do Novo Mundo":
Ele [Light] já nasceu com um dom de inteligência superior aos demais e com o poder dedutivo de seu pai.
Eu discordo. Kira chegou a reclamar da “fraqueza” do caderno da morte, como se o caderno lhe desse pouca vantagem durante toda a história:
-Infelizmente, o Death Note só pode matar a pessoa cujo nome está escrito nele. Então não posso fazer com que outra pessoa mate o L! É inconveniente! Essa é a falha do Death Note!
No capítulo 18 do anime, L diz por várias vezes saber que o Light é o Kira. O legal é que essa informação é passada no anime junto de alguns equívocos por parte do L, que também faz deduções erradas, porém apesar de erradas, todas essas deduções faziam muito sentido, não havendo nenhum demérito ao personagem, que é limitado, por ser humano. Isso confere muita verossimilhança à sua inteligência. Temos que convir que é muito fácil para o autor, que é onisciente, fazer com que o personagem chegue sempre às pistas corretas. Seria como ser um Goku, que destrói planetas apenas com a força da amizade, do amor, da superação, sem nenhuma explicação palatável para isso.
Vamos a cena. Light diz:
-Se é isso que você pensa, Misa e eu fomos o Kira durante o tempo em que fomos controlados, não é?
E L responde:
-É. Eu acho que eu não me enganei quanto a isso. Vocês dois são o Kira (...) Não que a minha dedução estivesse errada. O fato é que eu posso dizer que Light Yagami é o Kira e Misa Amane é o segundo Kira, mas isso não é o suficiente para resolver o caso.
Então repetindo. No capítulo 18 (o anime tem 37 capítulos no total), o L já diz ter certeza sobre o Light ser o Kira e sobre a Misa ser o segundo Kira. Mesmo com todas as dificuldades, L descobriu tudo! O problema é que o L tinha mais desvantagens do que parecia. Além de não matar ou expôr inocentes a risco, não controlar pessoas, não ter um caderno da morte para usar desimpedidamente, L também não conseguia se dar por vencido. Ele era orgulhoso e prisioneiro da própria maneira de agir. Na altura no capítulo 18 mais ou menos, L já tinha provas suficientes para colocar Light na cadeia, mas, como sabemos, para o L a única maneira de resolver o caso era se Light assumisse ser o assassino, e isso jamais poderia acontecer, sendo Light um mentiroso contumaz.
Agora vamos ao capítulo 25. Esse capítulo se chama “Silêncio” e reflete toda a aflição sentida pelo L durante seu seguimento. Para você, fã do Light, que não se permitiu enxergar todas as mensagens claras e óbvias sobre a superioridade do L contidas neste capítulo, eu vou lhe ajudar agora.
O capítulo começa com o que parece ser memórias de infância. A vida do L estava passando pelos seus olhos no momento em que ele visitava a sala do Watari, coisa que ele nunca fazia. Ah, e tem o sino. Ele ouvia um sino de uma igreja. As lembranças de quando ele era criança e visitava essa igreja ao lado de seu pai adotivo, Watari, inundavam sua mente. Você não percebeu? Era um prelúdio. Cara, enquanto estou escrevendo isso, deu até vontade de chorar aqui... Mas vamos seguir...
L pergunta a Rem (Shinigami da Misa) se é possível matar alguém escrevendo num pedaço de papel retirado do caderno. Rem diz não saber a resposta, mentindo, afinal ele estava sendo manipulado pelo Light. Essa pergunta do L mostra claramente que ele estava pensando em como o Light conseguiu criar falsas provas que o absolveram até ali. Em seguida L pergunta se deuses da morte gostam de maçãs, deixando claro que ele conseguiu fazer uma ligação entre o momento atual e as mensagens subliminares deixadas por light no início do anime. L está claramente no caminho certo. A suspeita recaiu de vez em cima de Light. Ele já tem mais do que convicção, restando apenas fazer o que lhe custaria a vida para que não houvesse mais nenhuma dúvida sobre Light ser o Kira, aos demais integrantes da força tarefa. Ele iria testar o caderno :’(
Tem mais. Na verdade, esse capítulo é um bombardeio de informações ocultas sobre o que se passa dentro da cabeça do L.
Ele pergunta ao Kira:
-Ô Light, finalmente está livre para deixar o prédio sozinho, mas parece que você não vai embora... Você está livre para ter uma relação com a Misa agora...
E o demônio responde:
-Isso pode esperar até conseguirmos resolver esse caso...
Em seguida, Light mostra toda a sua prepotência, e L, entende a mensagem claramente. Ele diz:
-Mas você está sugerindo que eu incomodo estando aqui?
L simplesmente diz: “Não” e olha-o fixamente.
Mais para frente, L explica brevemente porque Light está novamente sob alta suspeita. Ele explica em pensamentos que o Shinigami insistiu que não sabia se era possível matar usando apenas um pedaço de papel ao invés do caderno inteiro. Se tratando de um caderno sobrenatural e para um detetive do gabarito do L, pensar que isso é uma possibilidade totalmente factível, é um exercício tão simples quando um engenheiro químico usar um termômetro. Em seguida ele apresenta exatamente o único “fato” que o impede de demonstrar para todos que Light Yagami é um farsante: a regra dos 13 dias. Essa regra falsa, colocada no caderno pelo Rem, a mando do Light, diz que a pessoa que utilizar o caderno para matar alguém, deverá continuar escrevendo nomes dentro do intervalo máximo de 13 dias. Caso desrespeitada essa regra, a pessoa que usou o caderno, morrerá de parada cardíaca. Com muita astúcia, e provando toda a sua moral perante a comunidade e as autoridades mundiais, algo que não se consegue com simples sorte, e respeitando todas as leis internacionais, L consegue a autorização para utilizar um condenado a morte, e se propõe a testar o caderno. O condenado iria escrever o nome de um bandido no caderno, e se esse condenado permanecesse vivo por mais de 13 dias, o caso estaria encerrado. L chegou até aqui mesmo com todas as desvantagens. Isso sim é superioridade.
Agora vamos para mais uma cena emblemática, a cena da chuva. Ela nos mostra muita coisa também. L, numa atitude totalmente insólita, fica no exterior do QG, onde está caindo uma chuva tempestuosa. Light vai até lá e pergunta o que ele está fazendo sozinho na chuva. L diz que não está fazendo nada demais, e, num claro sinal de depressão, diz que ouve o sino tocar. Light diz que não ouve nada.
Na mesma conversa, L diz que está triste e que tudo o que ele diz não faz sentido, demonstrando total desacordo com toda a explicação que ele acabara de fazer sobre o que está o levando a fazer o teste do caderno. L não estava deprimido por achar que suas ideias não fazem sentido. Ele estava deprimido por outro motivo. Não faz sentido ele achar isso de si próprio, sendo ele a pessoa que chegou até onde chegou, estando prestes a fazer o teste que o colocará na iminência de resolver o “Caso Kira”. L está triste porque percebeu que nada vai mudar a mentalidade de Light. A verdade é que a essa altura, L já estava enfeitiçado pelo Light, seja por amor, ou por amizade.
Quando Light diz que teria problemas caso levasse a sério tudo o que L diz, numa demonstração clara e maquiavélica de todo o seu poder de dissimulação, L diz uma das frases mais emblemáticas de todos os animes, e que faz acontecer um silêncio que segue por longos segundos:
Me diz Light. Desde o momento em que você nasceu, teve algum momento em que você realmente disse a verdade?
A resposta manjada e previsível de Light para essa pergunta, fez L perceber mais uma vez o óbvio: Não adianta. Light é um monstro e não mudará.
Os dois vão para a escada e, entre outras coisas, L diz:
Daqui pra frente vai ser uma solidão... Eu e você vamos nos separar em breve.
Seja pelo fato de que L iria morrer em instantes, ou pelo fato de que o Light seria preso em instantes, a verdade é que L estava certo. Eles se separaram mesmo. Fica o exercício para cada um tentar entender o que se passava na mente do L naquele momento.
Eu disse que L estava enfeitiçado pelo Light, não disse? Tenho certeza disso, e apesar da ideia de deixar vocês pensarem sozinhos e chegarem a uma conclusão mais aprofundada sobre isso, seja tentadora, vou me adiantar aqui e colocar alguns pontos: É fato que o Light é um habilidoso manipulador de pessoas, tanto homens quanto mulheres. Não se pode afirmar que todos os homens manipulados por ele durante a trama sejam heterossexuais, mas também não é possível afirmar que eles só se deixaram ser manipulados por amor ao Light. O fato de tantos homens terem sido manipulados pelo Light, faz com que fique evidente que essa é uma habilidade natural dele, e que isso não tem necessariamente haver com questões amorosas. Mas eu não estou afirmando nada. Acharia bastante factível caso aparecesse alguma prova cabal do amor do L pelo Light, mas confesso que na obra, não encontrei nada que levasse a isso, mesmo tendo assistido Death Note inúmeras vezes. Temos que lembrar também que o L foi um menino isolado, sem amigos. E essa falta de amizades o tornou mais vulnerável contra justamente a maior habilidade do Kira: a manipulação. Sendo assim, eu concluo que o L despertou um sentimento muito verdadeiro pelo Light, mas que possivelmente não seja amor, não no sentido de namoro/casamento. O próprio L disse certa vez, numa das ocasiões em que resolveu praticar toda a sua sinceridade, que gostava muito do Light, e que ficaria muito triste caso tivesse que prendê-lo. Essas são palavras do próprio L mais no início do anime. Mas repito, não estou afirmando nada. O L pode ser o que quiser, e sempre terá minha admiração.
Embora essa discussão seja bastante longa e deveras superficial, é evidente que o L sempre tratou o "Caso Kira", assim como todos os outros em que esteve disposto a solucionar com muito profissionalismo, tratando de pelo menos não demonstrar sentimentos pessoais, quando esteve no exercício da sua função de detetive. Isso fica claro quando, no fim da cena da escada, o telefone toca, ele atende, e logo se recompõe rapidamente daquela maresia entorpecida de angústia que estava no seu semblante, demonstrando novamente toda a sua segurança, autocontrole e personalidade forte. Ele se levanta, diz que está “tudo resolvido” e vai em direção a sala continuar seu trabalho, sabendo de todos os riscos e consequências que viriam.
Nesse momento, vemos o velho L de sempre, e aí fica a pergunta: Ele esteve encenando para conseguir alguma informação ou postura suspeita do Light? Ele esteve falando a verdade sobre o seus sentimentos de tristeza pelo que está ocorrendo, e depois, vendo que não teria solução, resolveu agir novamente com racionalidade? Eu fico com a última opção, e mesmo reconhecendo que o L, de certa forma demonstrou fraqueza ao se envolver tão pessoalmente com o “caso Kira”, ainda assim, minha admiração por ele não muda. Ele se mostrou humano e personagens assim, bem construídos não são muito comuns no mundo da ficção. Parabéns novamente a Tsugumi Ohba.
No final desse capítulo vemos o desfecho, a morte do L, com a confirmação dos sinos, que tocam insistentemente em algum lugar. E se formos analisar bem, poderemos perceber duas coisas importantes:
1- O L descobriu, milésimos de segundo antes de seu coração dar o primeiro descompasso, quem foi que matou Watari. Ele diz: “Pessoal! O shinigam...” Sua fala é interrompida pelo começo do ataque cardíaco. Fica claro que se não fosse sua morte, L estaria mais uma vez na pista certa, para descobrir quem matou Watari. Isso é poder de raciocínio.
2- No final das contas, para os mais pragmáticos, L morreu satisfeito, visto que ele pode observar o semblante confissionatório de Light Yagami. Era isso que ele queria não era? Uma pena, o preço ter sido muito alto. Apesar de tudo, a morte do L foi uma morte serena, e ele morreu com o seu objetivo completado, objetivo este que nunca foi colocar o Light na cadeia.
Eu acredito que era para o Light ter sido preso naquele momento. A perda de todas as informações, que foram apagadas pelo Watari no momento de seu ataque cardíaco, colocaram o Light, numa posição confortável. Digo isso para destacar que além de todas as vantagens que o Kira tinha, ele ainda contou com a sorte em vários momentos, como ele mesmo disse: “Parece que a sorte está ao meu lado enfim”. Com a morte do L e do Watari, abriu-se uma lacuna na liderança da força tarefa, e Light se aproveitou disso. Porém, se houvesse mais pulso firme por parte dos membros, Light já estaria preso, pois a morte do L serviu como uma prova mais do que definitiva, bastando apenas fazerem ligações simples com os fatos. Tanto é, que não foram todos os membros da força tarefa que permaneceram no grupo... Havia alguém ali com 3 coisas importantes para seguir as investigações sozinho:
1- Coragem para enfrentar as consequências de sair do campo de visão do Kira;
2- Inteligência para colocá-lo abaixo de qualquer suspeita;
3- E isenção para analisar o ocorrido com frieza e calma, coisa que o Soichiro Yagami não tinha por ser nada mais nada menos que o pai do demônio, digo, do Kira.
Sendo assim, apenas 1 dos policiais da força tarefa, resolve se desligar e fazer uma investigação paralela. Medalha para ele.
A minha síntese é o seguinte: L teve todas as desvantagens e superou todas elas, conseguindo seu objetivo. Light, não tem mérito algum, exceto por ser bonito, e ter um caderno que “só” mata pessoas a distância, bem "básico" né? Mesmo assim, sua morte foi trágica, indigna de um deus.
Para encerrar esse nocaute nos redatores da Blast, eu vou deixar aqui mais um trecho da matéria deles, e peço para que vocês não riam muito da maneira usada por eles para defender o seu demônio/ditador favorito. xD
Obs: Se não for para destruir e humilhar seu adversário, o Nobunaga nem se presta a entrar no campo de batalha. Mas antes de pensar que eu sou muito chato e encrenqueiro, saiba que eu fui apenas desafiado a defender o L. Sou legal demais! xD
A cada uso [do caderno] ele descobria coisas novas e usava aquilo do jeito mais eficaz, não só do caderno como de quem também o possuísse e também dos seus seguidores. O poder de manipulação de Kira era incrível. Misa Amane o amava e ele usou disso como uma vantagem estrondosa. Como não dizer que ele é ‘O CARA’?
Boa risada a todos!